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PO Crítica - Os Indomáveis por Caio Coletti

Os Indomáveis
por Caio Coletti
http://o-anagrama.blogspot.com/
Novo e tradicional, aterrador e esperançoso, pessoal e coletivo, instintivo e planejado. As oposições que completam a receita do western mais fantástico do século.

Cinema não é simples. Equação complexa, cheia de elementos contraditórios que se põem em conjunção na busca de um resultado tão próximo da perfeição quanto possível, a sétima arte não deixa de ter também um pouco de científico nos processos que o levam de uma idéia a um produto cinematográfico pronto, embalado e entregue em nossas mãos. Cinema, além de instinto, é também premeditação. Uma entre muitas contradições que alimentam toda e qualquer produção cinematográfica que almeje algo mais do divertir, esse encontro sempre muito chocante se torna claro, ganha textura e definição, em Os Indomáveis, western do século XXI que não nega as raízes do gênero e nem por isso precisa deixar de ter toda uma personalidade própria. Porque, acima de definições e contradições, cinema é uma obra tão pessoal quanto coletiva.

E é esse show pessoal colocado a serviço de uma conjunção maior que observamos entre os dois protagonistas desse filme do versátil James Mangold, que passou por drama existencial (Garota, Interrompida), comédia romântica (Kate & Leopold) e musical (Johnny & June) até aportar no vespeiro que é o western da Hollywood moderna. O desempenho dele, por hora, é assunto para outra oportunidade. Porque o grande destaque aqui é mesmo a dupla Christian Bale e Russell Crowe, em opostos da trama e dividindo as cenas mais eletrizantes do filme e muito provavelmente da atuação moderna. O primeiro, que em 2007 vinha direto dos estouros que foram Batman Begins e O Grande Truque, ambos dirigidos e brilhantemente escritos pelo amigo Chris Nolan, tirou umas férias do tipo de atuação raciocinada que o diretor da nova série do Morcegão costuma exigir dos seus atores e colocou o instinto para funcionar em uma interpretação adequada, competente e concentrada. O segundo, por sua vez, vinha de dois dos maiores fracassos de sua carreira, A Luta Pela Esperança e Um Bom Ano, e se colocou como o proverbial vilão da trama, teoricamente, para prover o devido boost crítico que sua carreira estava começando a exigir. Talvez por isso sua atuação impressione mais aqui do que em qualquer outra obra que tenha seu nome nos créditos: nós, espectadores, tínhamos mesmo esquecido que estávamos diante de um dos atores mais talentosos e metódicos a surgir nos últimos anos.

A verdade é que muita da fascinação que as cenas divididas pelos dois provoca tem méritos bem fundados nos diálogos cerebrais, conceituais e brilhantes do roteiro escrito pela muito improvável dupla Michael Brandt & Derek Haas. Os dois, cujos créditos anteriores consistiam em filmes de ação descerebrados como + Velozes + Furiosos, e que futuramente estariam encabeçando o texto de O Procurado, realizam aqui uma constante e competente adequação de um conto do lendário escritor americano Elmore Leonard para a tela. Tudo bem que uma parte do mérito deve ser dada a primeira versão da história, realizada em 1957, na época do auge do faroeste ianque, mas todo o trabalho de adaptação dessa história para a percepção de western que o público moderno tem é crédito de Brandt & Haas. E, por mais que pareça, não se trata de uma missão fácil. Se o público já vê filmes comuns de forma diferente da que via a meio século atrás, a responsabilidade de se adequar a tal mudança na categoria do faroeste, a mais cultuada pelo público americano, é ainda mais pesada. A dupla sai ilesa, e ainda produz os diálogos mais empolgantes em muito tempo.

Claro, o filme não vive só de Bale e Crowe. Entre os coadjuvantes, o grande destaque vai para o jovem e visceral Ben Foster, conhecido por participações pequenas em X-Men: O Confronto Final e 30 Dias de Noite, que toma aqui o que pode ser o papel mais importante de toda a sua carreira e realiza um trabalho brilhante, intenso, belo de se observar vindo de um talento tão jovem de Hollywood. O futuro da terra do cinema tem, sim, esperança, e ninguém demonstra isso melhor do que o próprio diretor Mangold, imprimindo um tom todo seu a direção do faroeste e fazendo de cada imagem seu poema particular, enquanto deixa seu elenco e seu roteiro brilhar livres e soltos. Enfim, é um trabalho no ponto, que não interfere nem deixa de clamar por seu próprio espaço. E se esses dois demonstram que há uma luz no fim do túnel da crise de criatividade da terra do cinema, então Bale e Crowe representam os faroletes fortes que nos iluminam o caminho enquanto não chegamos lá. O melhor, mesmo, é aproveitar a viagem.
Caio Coletti
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About Leonardo Marques

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1 comentários :

  1. Como é bom ver o nosso trabalho repercutir desse jeito, com colaborações! É uma delícia visitar um blog amigo e constantar que o seu autor abriu espaço para os leitores enviarem seus próprios textos! E uma honra também, me ver publicado aqui!

    Ainda mais quando se trata de um filme que é tão querido pra mim. Acho que foi a primeira vez que me dei conta da validade e da visceralidade que o gênero do faroeste pode trazer para um filme, fiquei hipnotizado pelas atuações de Bale, Crowe e Foster, mesmerizado pela direção de Mangold, fascinado pelo roteiro de Brandt & Haas. Enfim, um dos poucos filmes verdadeiramente completos que pude ver.

    Abraço e sucesso, muito sucesso!
    :D

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